Que pena que agora (nestas eleições) inclusive os parentes das vítimas
da violência (pais, mães etc.) acabaram também
contaminados pelo vírus do populismus poenalis. O populismo penal,
precisamente porque explora (no pior sentido da palavra) uma
emoção atávica e primitiva do ser humano (medo do crime),
sempre constituiu terreno fértil para a germinação da clássica
“bancada parlamentar da bala” (ou do “chumbo grosso”),
constituída (sobretudo) de milicianos, policiais (ou ex-policiais) civis,
militares ou federais, juízes aposentados ou membros do Ministério Público.
Agora são os parentes das vítimas da violência que estão tentando
se eleger sob a virótica bandeira do populismo penal (O Estado de
S. Paulo de 12.09.10, p. A12). Eles não veem eficiência na
solução dos crimes, mas prometem (nas suas campanhas)
exatamente a mesma coisa (que sempre foi oferecida pela
classe política): mais rigor penal, irracionalidade, desproporcionalidade,
legislação vingativa emergencial etc. Mais e mais da mesma enganação!
A articulista (d’O Estado de S. Paulo de 12.09.10, p. A12) escreveu:
“Os candidatos vítimas de violência não têm plataformas tão radicais ou populistas
de combate ao crime”. Será?
Pregam o endurecimento das leis e apostam no apelo emocional.
Um deles quer a responsabilização penal de todas as crianças,
de qualquer idade, desde que se trate de crime hediondo e haja
avaliação psicológica positiva. Isso é totalmente inconstitucional (CF, art. 228).
O pai de uma vítima disse: “Nós temos uma postura mais humana,
queremos um sistema carcerário mais justo, não pena de morte”.
Os crimes hediondos, de qualquer maneira, têm que ter pena máxima
de 100 anos. Isso também é totalmente inconstitucional, porque significa
prisão perpétua (aliás: até à morte).
Vamos humanizar (!): 100 anos de cadeia, responsabilidade penal para todas
as crianças etc. Emotividade, irracionalidade e desproporcionalidade são as marcas
registradas do populismo penal, cujos defensores depositam muita fé (acreditam)
e pregam o rigor punitivo (do castigo) como “solução” para o problema da violência
e da segurança pública no nosso país.
O delito, especialmente quando cruel, gera fortes e emocionadas reações
nas pessoas. Essa reação emocional produz uma intensa demanda por
mais castigo, fim da impunidade e mais rigor penal. O castigo do crime
promove a coesão da sociedade (Durkheim). A pena acaba cumprindo,
na prática, essa função (função de união, de coesão, da coletividade).
A mídia usa e abusa dessa primitiva reação popular emotiva e hiperdramatiza
a violência, fazendo coro à demanda de mais rigor punitivo. O legislador,
sensível que é ao clamor público e midiático, sucumbe e aprova mais leis.
Alguns chegam até a defender o rigor penal como “solução” para o problema
da violência e da insegurança. Nesse ponto algumas propostas beiram
o charlatanismo.
Nas últimas sete décadas (de 1940 para cá) o legislador penal brasileiro
não fez outra coisa que aprovar mais e mais rigor punitivo. Luís Wanderley
Gazoto, que é membro do Ministério Público federal, acaba de
apresentar tese de doutoramento (na UnB) comprovando o seguinte:
de 1940 a 30.06.09 o Congresso Nacional brasileiro aprovou 122
leis penais, sendo 80,3% leis punitivistas (agravadoras da sanção penal),
12,3% leis benéficas ao infrator e 7,4% indiferentes. Algumas penas
foram quintuplicadas, sextuplicadas ou octuplicadas. Na 53ª legislatura da
Câmara dos Deputados (de janeiro de 2007 a 30.06.09) foram apresentados
308 projetos, sendo 95% punitivistas (incremento das penas). Na 52ª e 53ª
legislaturas do Senado Federal (de janeiro de 2003 a 30.06.09) foram
apresentados 172 projetos, sendo 97% punitivistas.
São sete décadas de populismo penal incandescente e nada de resultado
positivo. As prisões estão abarrotadas (quase 500 mil presos), mas a
criminalidade não diminuiu e a violência não se arrefeceu. Esse modelo
de mais rigor punitivo como “solução” para o problema da criminalidade
brasileira está esgotado. Transformou-se numa bandeira ilusória, puramente
simbólica, que só tem valor eleitoreiro (porque o povo ainda equivocadamente
acredita no discurso punitivista).
Temos que lutar (com todas nossas forças) por um programa de
prevenção sério e efetivo da violência (e da criminalidade em geral).
Temos que repensar toda nossa política criminal e mudar radicalmente
de rumo, adotando medidas concretas de prevenção primária (que cuidam
das raízes do crime), secundária (criando obstáculos ao crime) e terciária
(o criminoso não pode sair da cadeia pior do que entrou).
É chegado o momento de agirmos com responsabilidade e o máximo
de cientificidade nessa área. De “soluções” milagrosas, eleitoreiras
e irracionais já estamos (todos) fartos. O populismo penal, por tudo
que apresentou até hoje no Brasil, é anti-tiririca: com ele, a cada dia pior fica.
Saudações Dionisíacas
contaminados pelo vírus do populismus poenalis. O populismo penal,
precisamente porque explora (no pior sentido da palavra) uma
emoção atávica e primitiva do ser humano (medo do crime),
sempre constituiu terreno fértil para a germinação da clássica
“bancada parlamentar da bala” (ou do “chumbo grosso”),
constituída (sobretudo) de milicianos, policiais (ou ex-policiais) civis,
militares ou federais, juízes aposentados ou membros do Ministério Público.
se eleger sob a virótica bandeira do populismo penal (O Estado de
S. Paulo de 12.09.10, p. A12). Eles não veem eficiência na
solução dos crimes, mas prometem (nas suas campanhas)
exatamente a mesma coisa (que sempre foi oferecida pela
classe política): mais rigor penal, irracionalidade, desproporcionalidade,
legislação vingativa emergencial etc. Mais e mais da mesma enganação!
A articulista (d’O Estado de S. Paulo de 12.09.10, p. A12) escreveu:
“Os candidatos vítimas de violência não têm plataformas tão radicais ou populistas
de combate ao crime”. Será?
Um deles quer a responsabilização penal de todas as crianças,
de qualquer idade, desde que se trate de crime hediondo e haja
avaliação psicológica positiva. Isso é totalmente inconstitucional (CF, art. 228).
O pai de uma vítima disse: “Nós temos uma postura mais humana,
queremos um sistema carcerário mais justo, não pena de morte”.
Os crimes hediondos, de qualquer maneira, têm que ter pena máxima
de 100 anos. Isso também é totalmente inconstitucional, porque significa
prisão perpétua (aliás: até à morte).
as crianças etc. Emotividade, irracionalidade e desproporcionalidade são as marcas
registradas do populismo penal, cujos defensores depositam muita fé (acreditam)
e pregam o rigor punitivo (do castigo) como “solução” para o problema da violência
e da segurança pública no nosso país.
nas pessoas. Essa reação emocional produz uma intensa demanda por
mais castigo, fim da impunidade e mais rigor penal. O castigo do crime
promove a coesão da sociedade (Durkheim). A pena acaba cumprindo,
na prática, essa função (função de união, de coesão, da coletividade).
A mídia usa e abusa dessa primitiva reação popular emotiva e hiperdramatiza
a violência, fazendo coro à demanda de mais rigor punitivo. O legislador,
sensível que é ao clamor público e midiático, sucumbe e aprova mais leis.
Alguns chegam até a defender o rigor penal como “solução” para o problema
da violência e da insegurança. Nesse ponto algumas propostas beiram
o charlatanismo.
não fez outra coisa que aprovar mais e mais rigor punitivo. Luís Wanderley
Gazoto, que é membro do Ministério Público federal, acaba de
apresentar tese de doutoramento (na UnB) comprovando o seguinte:
de 1940 a 30.06.09 o Congresso Nacional brasileiro aprovou 122
leis penais, sendo 80,3% leis punitivistas (agravadoras da sanção penal),
12,3% leis benéficas ao infrator e 7,4% indiferentes. Algumas penas
foram quintuplicadas, sextuplicadas ou octuplicadas. Na 53ª legislatura da
Câmara dos Deputados (de janeiro de 2007 a 30.06.09) foram apresentados
308 projetos, sendo 95% punitivistas (incremento das penas). Na 52ª e 53ª
legislaturas do Senado Federal (de janeiro de 2003 a 30.06.09) foram
apresentados 172 projetos, sendo 97% punitivistas.
positivo. As prisões estão abarrotadas (quase 500 mil presos), mas a
criminalidade não diminuiu e a violência não se arrefeceu. Esse modelo
de mais rigor punitivo como “solução” para o problema da criminalidade
brasileira está esgotado. Transformou-se numa bandeira ilusória, puramente
simbólica, que só tem valor eleitoreiro (porque o povo ainda equivocadamente
acredita no discurso punitivista).
prevenção sério e efetivo da violência (e da criminalidade em geral).
Temos que repensar toda nossa política criminal e mudar radicalmente
de rumo, adotando medidas concretas de prevenção primária (que cuidam
das raízes do crime), secundária (criando obstáculos ao crime) e terciária
(o criminoso não pode sair da cadeia pior do que entrou).
de cientificidade nessa área. De “soluções” milagrosas, eleitoreiras
e irracionais já estamos (todos) fartos. O populismo penal, por tudo
que apresentou até hoje no Brasil, é anti-tiririca: com ele, a cada dia pior fica.